sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Tristeza e Alegria na Vida das Girafas

 Desde que me conheço que gosto de teatro. Mas de tempos a tempos surge uma obra-prima que merece ser compartilhada.
 Ontem, aconselhada por um bom amigo (que fazia por acaso parte da produção da peça, contribuindo enormemente para a genialidade do espectáculo como responsável por uma sonoplastia brilhante) fui até à Culturgest assistir ao último trabalho de Tiago Rodrigues, que devo desde já dizer é uma das maiores promessas a nível da encenação nacional. Tristeza e Alegria na Vida das Girafas é um espectáculo que gira à volta do turbulento mundo de uma menina adulta que se vê obrigada a crescer e acaba por matar a inocência com as próprias mãos, repleto de pormenores deliciosos e diálogos alucinantes.
 Este é um trabalho muito especial que descreve as felicidades e amarguras numa infância deslocada e nos transporta para o universo de uma menina perdida em si mesma, que se vê obrigada a atravessar a cidade alfacinha em busca do primeiro ministro, para que este outorgue uma lei que a permita obter uma subsrição vitalícia do Discovery Channel, de modo a poder concluir o seu trabalho escolar sobre girafas. Sempre acompanhada do politicamente incorrecto Judy Garland, seu urso de peluche e fiel confidente, que a (des)encaminha em busca da aventura pelas ruas da capital.

 Quem estiver interessado em assistir a esta maravilha do teatro nacional que aproveite o curto espaço de tempo em que ela ainda está em cena, hoje e amanhã à noite na Culturgest. A não perder!

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Alma Nua

 Assim que a olhou viu-lhe a alma nua. Antes do corpo, antes dos
lábios, antes de tudo o que lhe tiraria o sono nas noites seguintes, foi
a alma quem primeiro se despiu. E aí soube, seria ela, aquela alma
despida, nua de maldade e de amargura quem impediria o seu mundo
de se tornar cinzento. E assim foi.
 A primeira viagem que fizeram juntos durou infinitamente, até que dois
corpos cansados encontraram porto seguro nos braços um do outro. Foi
assim que começou, nada mais, nada menos: duas almas nuas e dois
corpos cansados.
 Não se pode amar alguém sem lhe ver a alma, percebeu, e por isso
mesmo, ao contemplar a grandeza que constituía o ser humano deitado
a seu lado riu-se, sabia agora sobre o que escreviam os poetas mortos.
Percebeu que não teria mais de viver no singular e a inexistência
do “eu” tornou-se-lhe confortável, nada dava mais prazer do que
existir como metade de um todo; Todo esse do qual sempre faria parte
integrante.
 Nunca nada fizera tanto sentido como aquele momento e então pensou
que talvez tivesse valido a pena a espera, a mágoa, o cansaço, para
que a sua alma pudesse despir-se e agradecer ao corpo sofrido pelos
tumultos passados em sua honra. Agora poderia descansar. Agora fazia
sentido. Agora valia a pena.
 O tempo passou e passaram com ele os comboios sem destino,
levando consigo tudo o que não era para ficar. Livrou-se, então, das
bagagens pesadas que lhe sobrecarregavam os ombros, livrou-se
de mentiras, barreiras e preconceitos que enegreciam os seus olhos.
Tornou-se mais leve.
Ponderara toda a vida sobre o que seria a felicidade e agora estava
diante dela. Ao acordar deu de caras com a personificação da beleza
no seu estado mais puro, à falta de melhor, usou o eufemismo “amor”
para descrever o que sentia. E assim foi.